Deputado Paulo Teixeira defende a reforma política com financiamento público de campanha, voto em lista e melhor representatividade da população. O voto distrital (aquele pelo qual Bush se reelegeu pelo voto da minoria) é rechaçado pelo Deputado. A matéria da revista Caros Amigos foi reproduzida pelo blog Viomundo.
13 de maio d e 2011 às 11:31
Paulo Teixeira: Uma reforma para ampliar a democracia
Por Paulo Teixeira*, na Caros Amigos
Antes de debatermos as propostas de reforma eleitoral colocadas em discussão, temos de avaliar nosso atual sistema político, sob o risco de jogarmos a criança fora junto com a água do banho.
Acredito, em primeiro lugar, que nosso atual sistema eleitoral e político tem grandes virtudes, resultados de 20 anos de luta popular contra um regime de exceção, que privou a sociedade brasileira do direito de decisão sobre seu próprio futuro.
Construída por muitos companheiros nossos, esta democracia é ampla, massiva e com qualidade em sua representação, nos dando um diferencial em relação a países com o mesmo grau de desenvolvimento econômico, como China e Rússia.
É esta democracia que construímos que garantiu a possibilidade de um operário e líder sindical chegar à Presidência da República por duas vezes. Que permitiu que uma mulher chegasse ao comando do governo federal. E que tornou possível ao Partido dos Trabalhadores se tornar a maior bancada da Câmara dos Deputados.
Nosso sistema de eleição proporcional garantiu, no Congresso, a reprodução do amplo espectro ideológico da sociedade brasileira, desde a extrema esquerda até a extrema direita, com representação de diversos interesses específicos.
Essas virtudes – representatividade de forças e participação massiva – têm de ser aprofundadas, enfrentando os reais problemas que temos.
Desafios e falsas soluções
A primeira fragilidade da democracia brasileira é o financiamento privado das campanhas, que torna o sistema de representação política refém do interesse das grandes empresas. O financiamento privado estabelece uma promessa de negócios junto à administração pública que tem sido uma das fontes de corrupção do Estado. Uma democracia virtuosa como a nossa não pode ter sua credibilidade colocada em xeque por denúncias sucessivas de escândalos.
O poder das empresas privadas também interfere na autonomia programática dos partidos e afasta da disputa eleitoral possíveis candidatos, como intelectuais, lideranças de movimentos sociais e pessoas comuns.
Alguns perguntarão se, diante de tantas demandas de saúde, infra-estrutura, educação, deveríamos aplicar dinheiro público no financiamento de campanhas eleitorais. Na nossa visão, é um gasto nobre que representaria um investimento na qualificação de nossa representação política.
A segunda fragilidade da democracia brasileira é a personificação das representações políticas. Nosso sistema é calcado em personalidades, e não em ideias e compromissos programáticos.
A solução para esta questão é a transição do voto uninominal para o voto no partido. Temos muitos exemplos de como implantar esse sistema garantindo maior liberdade ao eleitor na escolha do candidato.
Num sistema eleitoral em que os partidos tenham mais peso, será necessário também discutir a legislação partidária, para garantir a democracia interna nessas instituições. São comuns no Brasil comissões provisórias que se tornam permanentes, ou direções que se eternizam nas legendas, sem permitir renovações.
Em terceiro lugar, temos um número excessivo de partidos, com 21 legendas representadas no Congresso Nacional. E não há este espectro programático tão diverso na sociedade brasileira. Temos que acabar com coligações proporcionais ou transformá-las em federação partidárias – em que a coligação é obrigada a se manter após as eleições.
Muitos destes pequenos partidos sobrevivem à custa dos grandes partidos, se coligando em diversos estados com partidos diferentes. O fim da coligação proporcional diminuiria o número sem afetar os partidos programáticos. O P-SOL, por exemplo, não coliga e tem três parlamentares federais.
O voto distrital transformaria o parlamento nacional na soma de politicas regionais, sem garantir uma unidade programática que dê coesão às bancadas. Isso quebraria a virtude do sistema, que é proporcional em termos de forças politicas e de idéias politicas.
Aprofundar e qualificar a democracia
Do ponto de vista político mais amplo, nossa democracia ainda tem dois grandes desafios. Um é a intensificação e facilitação dos mecanismos de democracia participativa.
Os mecanismos de democracia participativa poderiam dar densidade a decisões sobre questões polêmicas, evitando até a judicialização de temas de interesse nacional. O limite da legislação brasileira sobre a pesquisa em células-tronco foi definida pelo Superior Tribunal Federal (STF), que decidiu sobre o tema por uma margem pequena de votos. Esse é um assunto de interesse de toda a sociedade que envolve questões de saúde, ciência e até religiosas. Melhor do que decidir esta questão em um debate teoricamente frio, sobre a letra da lei, não seria um processo de amadurecimento de nosso país fazer um grande debate nacional sobre todos os aspectos do tema e decidi-lo na urna?
O segundo grande desafio político de nossa sociedade e de nosso partido é construir uma representação mais real da sociedade brasileira dentro do Congresso Nacional e dentro dos partidos.
Tomemos como exemplo o recorte de gênero. Nossa sociedade é composta majoritariamente por mulheres. São 55 % de nossa população, mas apenas 8% de nosso parlamento. Na questão racial, também temos uma sub-representação tanto de negros quanto das populações indígenas.
Ou criamos mecanismos de representação ou continuaremos a ter um congresso majoritariamente com déficit de representação da sociedade, que reduz sua legitimidade.
É responsabilidade de todos nós, acadêmicos, militantes e estudantes, criar um novo marco que qualifique nossa democracia e amplie os espaços de participação popular.
Paulo Teixeira é deputado federal pelo Partido dos Trabalhadores (PT), advogado e mestre em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP).
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